terça-feira, 27 de setembro de 2011

Vísceras

Lucas Simões

Peles, pêlos, peitos. Pelas bordas da cama, seu sorriso com hálito de mormaço. (a tarde arde fora da janela como se fosse proibida).

Busco o ar com a língua - respiração boca a boca, pulmões cheios do céu em carne viva. O coração dispara como se quisesse correr para os seus braços.

Meu corpo pulsa as inevitáveis síladas: Eu te amo, te amo, te amo, Numa agradável arritmia.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Feito não para caber

Benedetta Falugi

Sentada assim, meio de lado,
Naquela varanda.
Você e as mãos apoiadas,
Os pés suspensos,
A cabeça inclinada.
Com seu vestido de botões
Demoradamente contados,
Com a pulseira de cinco voltas,
Com o chapéu cor de palha.
Você, que sem notar se espalha,
E avança sobre a grama, a telha, a sala
Até tornar inexplicável.
Você, com o jeito pousado,
Os laços tomados, o calor dilatado,
Infinita dentro dos meus olhos
E das minhas manhãs.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Sobre entender

Gabriella Barouch
Escuta o que não te falo
Calar é calor
Já não dizia o velho ditado.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Fuga

Benedetta Falugi
É só abrir a porta e entrar em casa. Mais dentro do que fora, mas ainda fora - posso ouvir pelas buzinas. Eu sei, a rua corre, as pessoas correm.
Meu coração corre pela sala quando lembra como é bom estar solto. Mas eu sei, mais dentro do que fora - embora fora do tempo quando contigo.

Mas ainda dentro.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Sobre aquela Ana

Benedetta Falugi

Era só uma tarde e era só o parque do Museu da República, cheio de crianças na altura dos joelhos e aviões muito acima - ali naquele espaço, céu. Onde só é permitida a entrada de quem sabe vencer a resistência do ar.

Nunca conheci nada mais resistente que o ar.

Olhei para meus pés e por alguns segundos me senti um idiota pelo simples fato de tê-los.

E imaginei você, Ana. E foi engraçado pensar na sua boca mastigando as barrinhas de cereal da Gol. Linhas Aéreas Inteligentes. Não era inteligente pensar em você, na sua boca ou nos teus cabelos que, chutava, deveriam agora estar metidos em algum rabo-de-cavalo mal feito, do modo exato como eu odeio.

Sabe, Ana, você é como essas crianças. Não precisa de pés, ou pode calçá-los sem parecer uma ridícula. E não consigo pensar em nada mais charmoso que isso, Ana. Você caminhando por esse parque com a leveza própria de quem sabe existir à vontade. Até parece que você não foi feita pra essa vida.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Incêndios

Rosemarie Fiore
As horas estalam em cantos de pássaros e motores desenfreados, enquanto o dia mal surge e já insiste em me levar rua abaixo. O movimento é inteiro e tinge todo o asfalto, tornando a cidade inutilmente vermelha, inutilmente atrasada.

A vida em forma de combustível avança na quinta marcha, pronta para estourar a qualquer instante. Aguardo no ponto de ônibus a minha vez de correr rabiscos cor de cimento. Dentro da minha camisa, fogos de artifício não me deixam mentir: estar vivo é acima de tudo um ato violento.